Cultura negra valorizada na escola

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Recebi um convite para ir à Escola de Referência do Ensino Médio Mariano Teixeira, localizada no bairro de Areias, onde os alunos se dedicam à Semana Estadual de Vivência e Prática da Cultura Afro-Pernambucana. Sala cheia, trabalhos em cartazes, em vídeo, muita vibração da meninada. Na segunda-feira, era dia de apresentar a produção. Muito interessante, a iniciativa. Aprendemos, durante longo tempo as lições de história pela ótica dos poderosos. Felizmente, hoje, não é mais assim. A julgar pelo tom adotado nos trabalhos mostrados por alunos do primeiro ao terceiro ano do ensino médio daquela unidade. O enfoque aqui foi outro: a resistência, os quilombos, a forte herança da cultura negra nos nossos dias.

Para começar, a abertura dos trabalhos foi com a execução do Hino de Pernambuco, em ritmo de maracatu, claro. Com direito a homenagem a Naná Vasconcelos, “mestre dos mestres dos maracatus”. Como vocês lembram, o famoso percussionista comandou por vários anos anos a cerimônia de abertura dos carnavais recifenses, regendo os tambores e alfaias dos maracatus pernambucanos. Vejam só os temas de alguns trabalhos apresentados por alunos: Quilombos urbanos e quilombos rurais antigos e atuais, Os mestres e mestras do coco em Pernambuco, Arte Afro-Pernambucana, Mestres das Emboladas de Pernambuco, Mestres Cirandeiros. Até mesmo a Noite dos Tambores Silenciosos, uma das manifestações mais significativas do carnaval pernambucano foi tema de trabalho.

Célia motiva estudos sobre Malunguinho, tão importante quanto Zumbi, mas ainda  esquecido pelos livros de história.

No caso dos quilombos, houve enfoque em Malunguinho, menos famoso mas não menos importante do que Zumbi dos Palmares. Malunguinho  foi Chefe do Quilombo do Catucá, que  funcionou nas matas de Abreu e Lima. Era muito temido pelos senhores brancos e libertou muitos negros. A lenda diz que ele tinha uma chave mágica, que abria todas as correntes que aprisionavam seus irmãos. Ferido pelo Exército, foi abrigado pelos índios à beira da morte, quando passou a assimilar a tradição indígena em sua vida física e espiritual. Hoje é reverenciado como juremeiro, libertador dos espíritos. Embora seja esquecido na maior parte dos livros didáticos, Malunguinho tem vez naquela Erem. “Quando se fala em Zumbi, associa-se logo a figura dele à consciência negra, mas Malunguinho ninguém conhece”, afirma a Professora Célia Cabral, uma das organizadoras do evento.

“Os alunos não podem se limitar ao arrumadinho dos livros, têm que desenvolver o senso crítico”, diz, acrescentando que as atividades da Erem são baseadas em ações afirmativas. Esse ano já teve a Semana da Diversidade Sexual, a Semana do Baobá, a da Vivência e Prática da Cultura Afro Pernambucana. A próxima será sobre Consciência Negra. São 600 alunos, divididos em quinze turmas. “Percebi que vocês estão preparados para a universidade, pelo padrão de qualidade dos trabalhos que vi aqui”, afirmou Alexandre L´Omi L´Odó (foto no alto), especialista em cultura afro, com mestrado em Ciências das Religiões. “O interessante no trabalho da professora Célia Cabral é o destaque aos heróis e personagens negros de Pernambuco, o que contribui para fortalecer a identidade afro no nosso Estado”, diz o antropólogo Fernando Batista, que ajudou a escola a plantar um baobá em seus jardins. A árvore sagrada é um dos símbolos da cultura africana.  Há doze anos, Célia desenvolve trabalhos para aprofundar nos alunos o conhecimento e valorização da cultura negra, inclusive disseminando o conhecimento sobre Malunguinho, que é reverenciado nos terreiros. Já vi preocupação semelhante na Erem Cândido Duarte, que fica no bairro de Apipucos. A escola chegou a plantar um baobá e uma jurema, como para assinalar a presença negra na nossa cultura.

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Texto e foto: Letícia Lins / #OxeRecife

2 comments

  1. Parabéns, Profª Célia! Sempre realizando e incentivando trabalhos, assim como atividades culturais que valorizam a cultura negra pernambucana. Contribuindo, desse modo, para o fortalecimento do pertencimento da identidade cultural afro do Estado.

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