Quando eu era criança, ao acordar no Sábado de Aleluia, corria para a calçada. Tudo para ver quem era o “Judas” a ser malhado. Nas caladas da noite, alguém sempre armava o boneco e pendurava em um poste, com o nome de algum vizinho que fosse polêmico, violento ou se insinuasse em demasia para as mulheres da comunidade. Havia um (só lembro o apelido, Seu Cacau ) já falecido, que foi malhado muitas vezes. Coitado. Hoje, na minha caminhada matinal, encontrei um “Judas” sentado na areia, à margem do Açude de Apipucos. Adivinhem quem era? O Presidente Jair Messias Bolsonaro. À tarde, recebi via redes sociais várias fotografias de outros “judas”, espalhados no Recife e em Olinda. Todos eram alusivos ao Presidente.
Bolsonaro, vocês sabem, de Messias. .. não tem nada. Só o nome. Então, populares o escolheram como o traidor de 2021. A julgar pela rústica placa deixada no peito do “Judas”, tudo tem a ver com a forma equivocada com a qual ele vem “administrando” a crise sanitária provocada pela Covid-19. Ou seja, uma alusão à posição negacionista do Presidente, em relação à pandemia, que colocou o Brasil em situação bem desconfortável perante a própria população e perante a comunidade internacional.
Nos últimos dias, tanto o número de novos casos quanto de óbitos vêm batendo recordes no país. O último político que eu vira ser malhado, no Recife, foi em 2005. O escolhido foi o então Presidente da Câmara dos Deputados, Severino Cavalcanti (1930-2020). Aconteceu no bairro da Boa Vista, no Centro do Recife, por conta de suas declarações homofóbicas. Mas o “Judas” da vez, pelo menos no meu bairro, é o Presidente da República. De camisa branca e calça azul marinho, o Judas da pandemia tem uma tosca placa colocada em seu peito. “Bolsonaro, isso é só uma gripezinha (sic). E daí todo mundo vai morre (sic) mesmo”. No Brasil, já são mais de 328 mil vidas perdidas para a pandemia.
A malhação de de Judas é uma tradição comum à Semana Santa e que é praticada em vários países da América Latina, onde foi introduzida por espanhóis e portugueses. No Nordeste, a prática era mais frequente no passado. Quase toda rua tinha seu judas para malhar. Era o chamado “serrar velho”. Geralmente o Judas é um boneco do tamanho natural de um homem, feito em tecido. Seu “recheio” é com pó de serragem, retalhos velhos, trapos, pedaços de jornal. Ele é colocado em determinado lugar e depois populares o espancam ou ateiam fogo ao personagem tido como “traidor” como foi o Judas em relação a Jesus Cristo. O ato ocorre em frente de igrejas, cemitérios, ou mesmo no meio das ruas. Chama-se “malhação” ,”serrar velho” ou “queima do Judas. À tarde, recebi as fotos de vários “judas” espalhados por Recife e Olinda. E todos eram Bolsonaro. Veja na Galeria:
De acordo com a Secretaria Estadual de Saúde, nesse sábado foram notificados 985 novos casos da Covid-19, 103 dos quais são a Síndrome Respiratória Aguda Grave, quando o paciente fica sem respirar e precisa de internação. Agora, o estado computa 354.982 pessoas que foram infectadas desde o início da pandemia, 36.515 das quais desenvolveram a Srag. Nas últimas 24 horas foram confirmados 54 óbitos, o que eleva para 13.348 o total de vidas perdidas para a pandemia.
Nos links abaixo, você pode conferir outras informações sobre a Páscoa e também sobre Bolsonaro
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Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Letícia Lins e Redes Sociais