Se não tivesse sido tão degradada ao longo das três últimas décadas, a Avenida Conde da Boa Vista poderia estar para o Recife como a Paulista para São Paulo. Ou seja (com jardins centrais, banquinhos, arborização e calçadas largas), teria sido uma espécie de cartão de visitas e também uma forma de reforçar a identidade da nossa Capital. Mas o que ocorreu? Poluição visual em excesso, calçadas esburacadas e tomadas por camelôs, edifícios sem nenhuma conservação. E o que é pior, ganhou obras como as famigeradas estações de BRT e cercas separando as duas pistas que acabaram por embrutecer e detonar por completo a sua paisagem. Passei lá em um domingo desses, quando ela está mais tranquila, conforme mostra a foto. Mesmo assim, a poluição visual persiste, seja nas placas das lojas, no cercado que divide certas partes da Avenida ou mesmo na sujeira que se acumula em muitos trechos.
As últimas grandes mudanças foram introduzidas entre 2007 e 2008, durante a gestão do então Prefeito João Paulo Lima e Silva (na época no PT), naquelas que foram consideradas as piores intervenções feitas pelo ex petista no centro da cidade. A ideia que se tem é que uma bomba detonou a avenida, tamanha a sua decadência (como aliás, a maior parte do centro do Recife). Agora, parece que a paisagem vai mudar de novo. Não sou urbanista nem arquiteta e não tenho condições de avaliar visualmente o resultado das obras que serão introduzidas. Mas a julgar pelo que nos foi mostrado pela Prefeitura, a situação deverá ficar melhor do que está. Porque pior, sinceramente, é impossível. É preciso, no entanto, que a fiscalização evite a poluição visual que toma conta hoje dos dois lados da avenida, inclusive nos estabelecimentos comerciais. E também evite a ocupação permanente de suas calçadas.
Os serviços de requalificação do que vem sendo chamado de Nova Conde da Boa Vista, começam nessa terça-feira (dia 2) e custarão R$ 15 milhões aos cofres municipais. Esperamos, no entanto, que essa verba já esteja garantida para evitar que haja paralisação, fato que ocorre sempre, quando o assunto é obra pública. Em se tratando de avenida central, o transtorno seria grande com qualquer interrupção. O cronograma prevê a divisão da via em seis trechos, três dos quais começam hoje, afetando 38 linhas de ônibus. As intervenções acontecem em fases pré-determinadas, com um plano de circulação específico para cada uma delas. “O principal corredor de ônibus e de pedestres do Recife vai se tornar uma via muito mais humanizada, arborizada e acolhedora, contando com iluminação em LED, postes específicos para o pedestre, canteiro central ajardinado e floreiras nas calçadas, ampliação dos passeios públicos, bicicletários, dentre outros equipamentos”, informa a Prefeitura. Bicicletários? Sim, bicicletários. Mas… e a faixa exclusiva para ciclistas, onde fica?
Com as obras que começam nessa terça, 38 linhas de ônibus terão suas paradas deslocadas, no sentido subúrbio cidade, o que deve gerar transtorno para boa parte da população. O que causa estranheza maior no projeto é o fato de a possibilidade de ciclovia ter sido banida dos planos oficiais. Em tempos de mobilidade tão problemática, é fundamental que requalificação de via tão importante quanto a Conde da Boa Vista conte com esse equipamento, cada vez mais comum nas grandes cidades espalhadas pelo mundo. Apesar de estar com o visual sofrível, a Conde da Boa Vista já foi um lugar bonito. Tanto que, no passado, chamava-se Rua Formosa. Foi construída sobre um aterro (como quase tudo no Recife) no século 18. Mas no século seguinte – lá pelos anos 1840 – o Governador Francisco do Rego Barros, o Conde da Boa Vista, decidiu ampliá-la. Com a sua morte, em 1870, a rua passou a ter o seu nome. E em 1946, durante gestão do então Prefeito Pelópidas da Silveira, passou por modernização – incluindo alargamento – e virou avenida. Vamos aguardar, e ver como ficará a mais importante via do Centro do Recife.
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Texto e fotos: Letícia Lins / #OxeRecife