O Recife vai ter uma coleção de títulos para chamar de sua, na altura da real importância como a capital brasileira mais antiga do País. E prepara-se, no momento, para comemorar os seus 500 anos. Calma, gente, a festa não é agora não. Pois a cidade só completa cinco séculos de existência como capital em 2035. Mas até lá, muitas águas vão rolar. Estudos, projetos, transformações. Comparações entre o Recife e Amsterdã. Tudo de olho no futuro, com um pé na experiência do presente e no aprendizado do passado. Para ajudar na tarefa de entender melhor a nossa realidade, apontar diagnósticos, necessidades e soluções, a cidade vai ganhar doze títulos em 2022. Publicados pela Companhia Editora de Pernambuco, os livros da Coleção Recife 500 anos não serão comercializados. Porém estarão disponíveis para download no site Acervo Cepe (www.acervocepe.com.br). Ou seja, qualquer pessoa interessada pode ter acesso gratuito às informações, que vêm sendo reunidas por 70 pesquisadores.
Os quatro primeiros volumes da Coleção, como já disse aqui, serão lançados na sexta-feira (15/07), no auditório Brum, no Centro de Convenções de Pernambuco. São eles: Parque Capibaribe: A reinvenção do Recife Cidade Parque; Recife drenagem urbana: Entre rios e o mar, caminhos e descaminhos das águas na cidade; Recife 500 anos: Estratégias para construir a cidade do futuro e Recife Exchanges Amsterdam, Holland, Netherlands: Intercâmbio internacional para reinventar a cidade. Em edição bilíngue (português-inglês), a série será distribuída pela Prefeitura do Recife. Até o final do ano, ainda serão publicados os seguintes títulos: Recife árvore d’água; Recife corpo e alma – A reinvenção do Recife entre os século XX e XXI; Recife Cidade Parque; Recife, 500 anos de evolução urbana; Recife no urbanismo pioneiro de Saturnino de Brito; Compaz: A Fábrica de Cidadania do Recife; A metrópole do Recife – Formação, configuração e desafios estratégicos e Arquitetura pernambucana – Escola do Recife, ensaios de grande sombra.
Conheça melhor, abaixo, os quatro primeiros volumes da Coleção Recife 500 anos:
O livro Recife 500 Anos traça estratégias para nortear o desenvolvimento da cidade, a médio e longo prazos, funcionando como um guia para o poder público e a sociedade. Na publicação, os pesquisadores mostram caminhos para a capital se tornar mais inclusiva, conectada e sustentável até 2037. Lançado em 2019, o livro tem edição ampliada e atualizada. Defende o Recife com educação pública de qualidade, que permita redução da pobreza e igualdade de oportunidades sem distinções. E preconiza uma cidade conectada, dotada de vasta rede de fibra óptica, além de fazer uso, em larga escala, dos recursos da Internet das Coisas. E, para ser sustentável, deverá desenvolver economia de baixo carbono, com mais geração e distribuição de energia solar, redução do consumo de combustíveis fósseis.
Também preconiza o aumento da cobertura vegetal (claro, mais do que necessário!). Habitação digna e segura é um das grandes necessidades do Recife. Boa parte da população da cidade reside em mangues (em palafitas que parecem poleiros) ou morros ( em casas nas encostas, que lembram pingentes). São milhares de pontos de risco, que deixam os moradores de baixa renda em total insegurança. As tragédias provocadas pelas chuvas no final de maio e inicio de junho de 2022 mostram o tamanho do desafio e a necessidade de intervenções nessa área para já. Aliás, para “ontem”. A foto aérea de morro integra a publicação Recife 500 anos.
Em Parque Capibaribe – A reinvenção do Recife Cidade Parque, as propostas são detalhadas em 328 páginas ilustradas com fotos. O título traz como desafios para a cidade a revitalização das margens do Rio Capibaribe, o aumento da área verde e a articulação de corredores ambientais que possam reduzir a temperatura, reduzir o uso de automóveis ( para diminuir a emissão de gás carbônico) e criar mais espaços de lazer. A ideia é que, margeando o Rio, as pessoas possam chegar ao centro a pé ou de bike. É organizado pelos arquitetos Circe Monteiro, Luiz Vieira e Roberto Montezuma, que avaliam a configuração atual e futura da cidade. Como se sabe, o Rio Capibaribe foi sendo degradado com o passar dos séculos. Além de sofrer poluição por conta do escandaloso deficit de saneamento básico, o “rio das capivaras” perdeu o protagonismo ao longo do tempo, pois – diferente do que ocorria no passado – o Recife passou a ser construída de costas para ele. Virou quintal, lixão, esgoto a céu aberto.
O Parque Capibaribe pretende transformar o Recife em cidade jardim, mais verde, mais aprazível. Projetado para ser concluído até 2037, o sistema inclui percursos de 30 quilômetros de extensão às margens do Capibaribe, deve beneficiar 42 bairros e 500 mil pessoas. Será no futuro o Recife uma Amsterdã, como era no passado?
Observem, na gravura antiga, a integração rio, arquitetura, população. Só nostalgia…
Produto de três eventos que resultaram num trabalho colaborativo entre arquitetos da UFPE e da Holanda, Recife Exchanges Amsterdam, Holland, Netherlands: Intercâmbio internacional para reinventar a cidade foi organizado pelos arquitetos Roberto Montezuma, Fabiano Diniz, Luiz Vieira, José Evandro Henriques e Mila Avellar. Com 318 páginas, traz propostas para melhorar o uso dos cursos d’água (rios e canais) e dos manguezais, para ampliação de áreas verdes e para a criação de um sistema de transporte intermodal integrado (bicicleta, BRT, teleférico, barco, metrô) que permita a conexão entre parques, com ruas arborizadas. Tudo apoiado na experiência da Holanda com despoluição de canais e recuperação de margens de cursos d’água. De certa forma, o que a publicação defende se casa com as ideias preconizadas no Parque Capibaribe. Esse livro, aliás, funcionou quase como um embrião para a Coleção Recife 500 anos e para o Plano Recife 500 anos. Afinal, desde o século 17, a Holanda tem muito o que nos ensinar.
“A obra integra o Plano Recife 500 anos, que se tornou a base de um projeto de cidade, fruto de convênio entre a prefeitura e a UFPE, em consonância com a Nova Agenda Urbana da ONU-Habitat”, informa a Cepe. A história da criação do plano remonta ao primeiro intercâmbio Recife Exchange Amsterdã, uma iniciativa do Governo dos Países Baixos, em parceria com o Itamaraty, quando um grupo de arquitetos holandeses visitou o Recife em 2011. A intenção era homenagear os 100 anos da imigração oficial da Holanda para o Brasil e para as Américas, iniciada em 1911. “Era preciso pensar o Recife de forma holística. Essa planície molhada foi muito aterrada e tinha mudado. Hoje há o Recife Metropolitano, com 1,6 milhão de habitantes e o Recife Metrópole com cerca de 4 milhões de habitantes, muito diferente daquele Recife holandês (sede da Companhia das Índias Ocidentais no Brasil, de 1630 a 1654)”, analisa o arquiteto e urbanista Roberto Montezuma, coordenador acadêmico do projeto.
Recife drenagem urbana – entre rios e o mar, caminhos e descaminhos das águas na cidade foi organizado pelo engenheiro civil e professor do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da UFPE Ronald Vasconcelos. E aborda um dos mais sensíveis desafios: a convivência e o manejo das águas pluviais. Até porque o Recife foi construído sobre aterros, e os rios pedem passagem a cada inverno. O Recife é banhado pelo Oceano Atlântico, cortado por oito bacias de rios, e se situa, em parte, no nível do mar. Conta hoje com 99 canais, que no passado foram rios ou riachos. Perto de completar cinco séculos, a capital ocupa a 16ª posição no ranking das cidades mais vulneráveis à mudança climática no mundo devido ao avanço do nível do mar de acordo com o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC). Soma-se a isso o fato dela ser a capital do estado que possui a maior taxa de ocupação da faixa litorânea no país. O livro reúne em oito artigos o trabalho de 22 especialistas, entre professores, pesquisadores, consultores e gestores públicos, com análise aprofundada. Avalia temas sensíveis como as dinâmicas da ocupação urbana desde o período holandês, a estrutura fluida da capital, novas técnicas compensatórias de drenagem, entre outros temas. Na última foto do post, o Recife molhado. E pelo conteúdo disposto nos quatro volumes, já dá para perceber como eles se integram. Tudo se entrelaça. Inclusive Recife e Amsterdã.
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Serviço
O que: Lançamento da coleção Recife 500 Anos
Quando: 15 de julho
Local: Auditório Brum do Centro de Convenções de Pernambuco
Hora: 15h
Texto: Letícia Lins / #OxeRecife
Fotos: Daniel Almeida, Rafael Cacau, Andréa Rego Barros, álbum Luiz Schlappriz (Memórias de Pernambuco, 1863, Gilberto Ferrez)